quinta-feira, 3 de março de 2011

O povo à matroca nesse mundo gramatical
Talvez você esteja lendo a primeira linha desse texto por que tenha ficado curioso em saber o que significa a palavra “matroca” que aparece no título. Pois vou lhe dizer, continue lendo para descobrir. Dependerá de sua capacidade gramatical.
Num bairro, existem cem moradores. Noventa desejam água encanada, podendo usufruir desse líquido diretamente na torneira. Dez querem a construção de poços, tendo o prazer de encher as latas d’água e colocá-las na cabeça até chegar em casa. O que os governantes devem fazer? Ora, devem construir os poços para todos os cem moradores utilizarem. Que absurdo! - poderia dizer o nobre leitor. Isso jamais irá ocorrer num regime democrático, no qual a vontade da maioria prevalece. Pode até não acontecer num mundo democrático , mas que acontece no mundo lingüístico-gramatical brasileiro ... ah ... acontece.
As pessoas, em geral, pensam que usar palavras difíceis, construções gramaticais complicadas, ou coisas do tipo, é saber se comunicar. Mas isso é um engano. A comunicação é um processo em que o emissor envia a mensagem ao receptor, de forma que, este, compreenda o que foi dito.
Sempre escuto: “Nossa!Como ele fala bem. Esse aí sim, sabe português!” A pessoa certamente não entendeu nada daquilo que o outro falou, mas, elogia, admira-se. Também ouço: “ Ave Maria! Só fala errado. Nem sabe falar português!” Embora tenha entendido o que foi dito, a pessoa critica, diminui o outro, somente por ele não ter usado palavras que ela desconhece.
Senhoras e senhores, esse é o mundo lingüístico-gramatical atual. Perdoe-me a assonância e a rima. Isso por que segundo as autoridades gramaticais, combinação de sons vocálicos só em poemas. Engraçado, eu não sou poeta e usei. E não vou tirar do texto. E nem por isso o leitor vai deixar de entender a mensagem. Opa! Desculpe pelo polissíndeto. Ah! Desculpe também pela repetição da palavra “acontece” no final do segundo parágrafo e também da palavra “desculpe” neste. Deixa pra lá. Vamos continuar.
Esse é o regime lingüístico-gramatical brasileiro. Noventa pessoas de posse de uma linguagem simples, a qual permite uma boa comunicação, e, dez pessoas falando e escrevendo de uma forma incompreensível, usando palavras totalmente desconhecidas da maioria da população, somente para causar admiração, querendo ser superiores, inatingíveis. E os gramáticos, que são os governantes do mundo gramatical, o que fazem? Ora, criam inúmeras regras absurdas(poços d’água) para toda a população utilizar.
Minha gente, a língua não pode ser um instrumento de preconceito. As regras gramaticais não podem ser inventadas. Elas surgem no seio das diversas línguas(português, inglês, italiano, espanhol, chinês, russo, etc.) e, aos gramáticos, cabe apenas transcrever estas regras. A gramática deve se adequar às regras surgidas no meio da população lingüística, e não, impô-las, pois apenas uma minoria irá assimilá-las.
E então, já descobriu o que significa “matroca”. Negativo? Fique despreocupado. Não há nada de errado com sua capacidade gramatical. Quando escrevi o título, quis dizer que o povo anda à toa, sem rumo, nos assuntos gramaticais. Poderia ter usado uma palavra conhecida, mas tive que utilizar “matroca”, na tentativa de fazer você ler esse texto até o final. Já que gosto tanto de me desculpar, peço desculpas por fazer uso de um recurso típico das mídias de massa e dos programas sensacionalistas. Qual? Recorrer à sua curiosidade para tentar obrigá-lo a fazer algo. Mas e aí? Foi melhor ler o texto ou você preferiria ter ido a um dicionário, descobrindo o significado da palavra “matroca” de uma vez, sem emoção? Até mais.


Professor Francisco Lira

Nenhum comentário:

Postar um comentário